Em tempos de COVID-19
Hoje o pessoal que cuida do nosso conteúdo online disse que precisávamos falar de COVID-19, mas sob a minha visão e eu não sei se tenho alguma visão sobre isso.
Fato é que já li tanto sobre isso, já vi tantos vídeos, já recebi tantos links e o assunto ainda está bem confuso na minha cabeça. Recentemente viajei, estive em feiras e reuniões com escolas internacionais: dei e recebi apertos de mãos, abraços e beijos, depois fiquei sabendo que havia me encontrado com pessoas infectadas… Também no escritório tive membro do meu staff infectado, mas até o momento, não tive nada.
Deve ser porque eu sou ruim, deve ser isso. Minha mãe sempre me falou que “erva ruim, a geada não mata” e eu devo pertencer a este time. Brincadeiras à parte, o negócio é sério.
Eu, Perpetua Devite, acredito que reclamar não seja a solução para nenhuma situação desfavorável, então aqui o tom não será de reclamação e sim uma conversa sobre o mundo dos intercâmbios atualmente. Recebemos muitas perguntas, todos estão inquietos querendo saber sobre o que está acontecendo na vida dos atuais intercambistas e como estão seus programas.
De maneira geral:
Das escolas que pararam com data prevista para o retorno, algumas estão com aula online, outras não;
Outras escolas de alguns países decidiram antecipar e encerrar o semestre acadêmico antecipadamente e não mais em Maio e Junho como de costume.
Os estudantes estão de quarentena em casa, com suas famílias hospedeiras. De vez em quando saem para fazer alguma coisa isoladamente: bater bola na quadra de basquete, correr, passear com o cachorro. E outros estão “gastando” o tempo com o que tem disponível: aulas online, brincadeiras com os irmãos, inventam receitas novas na cozinha e assim vai. Por enquanto, apesar de entediados algumas vezes, estão levando tudo numa boa.
Para a maioria dos nossos intercambistas, essa crise chegou bem naquela fase do programa que eles e as famílias acham que não conseguirão viver um sem o outro. Mas, infelizmente temos famílias que perderam a condição financeira e não conseguem mais ficar com os estudantes. Temos também outras famílias hospedeiras que possuem membros mais expostos ao vírus porque trabalham na área de saúde; existem famílias que os filhos naturais moravam em campus universitários e com a suspensão das aulas voltaram pra casa, e temos ainda as famílias que estão simplesmente com medo: medo que adoeçam e não possam cuidar dos estudantes ou medo que os estudantes adoeçam e se torne grave.
A esta altura do campeonato se uma família hospedeira não pode mais hospedar um estudante, não há como arrumar outra. Então para os casos em que a família hospedeira não consegue mais hospedar e para os alunos de escolas que encerraram o ano letivo, a volta para casa foi aconselhada.
Fiquei muito feliz em ver que os estudantes não foram desligados dos programas, que poucos pais naturais solicitaram que seus filhos voltassem abandonando seus programas antes do posicionamento oficial das instituições de ensino e governos. Por falar nisso, não tivemos nenhum cancelamento. Claro, tivemos a orientação geral para alteração de datas dos alunos que embarcariam em abril e maio. Esse adiamento dos programas foi necessário porque alguns consulados e a própria Polícia Federal cancelaram seus expedientes e atendimento ao público em geral mantendo apenas o atendimento para emergências, alguns países fecharam fronteiras, e algumas companhias aéreas deixaram de voar para determinados aeroportos ou reduziram a malha aérea dificultando muito as viagens, além da recomendação da OMS para que os deslocamentos sejam evitados.
Os programas com início a partir de julho deste ano seguem inalterados e seguem confirmados. Claro, temos alguns pais apreensivos e eu, como mãe de um adolescente de 16 anos inscrito em um programa de High School com início em agosto deste ano, me incluo nesse grupo. Talvez tenhamos uma demora maior para colocações e confirmações de escolas, mas os programas estão mantidos!
A coisa mais difícil e frustrante para mim tem sido trazer os estudantes de volta e estou sofrendo junto com eles, eu mesma entrevistei cada um antes de seus retornos e me lembro de vê-los, alguns deles, baterem o pé no firme propósito de “deixa eu ir”: vi futuro intercambista tocar flauta na Paulista pra arrecadar dinheiro para o intercâmbio, eu vi gente fazer marmita e vender na escola para ajudar os pais, os vi abdicando de passeios, mesada, roupa nova, os vi fazendo escolhas difíceis, negociando concessões com os pais … tudo em nome do sonho do intercâmbio.
Eu os orientei e os preparei para o que vinha pela frente e para quais situações poderiam enfrentar durante seus programas, eu os preparei até para greve nas escolas, mas não para um Corona vírus. Como eu poderia tê-los preparado para uma situação como essa? Quem poderia adivinhar?
Tenho visto minha moçadinha tomando difíceis decisões e de forma maduras entre ficar no programa ou voltar para casa e tenho imenso orgulho de cada um deles. Mesmo que a primeira reação seja sempre de choro ou de tristeza, depois vem a maturidade que me impressiona: “é o melhor que eu tenho pra fazer agora.”
Confesso que é difícil atender as ligações deles chorando do outro lado da linha, alguns quase nem conseguem falar, só choram e quando conseguem falar apenas perguntam: “_ eu vou ter que ir embora mesmo?”.
Aos poucos estou conseguindo lidar melhor com a tristeza e frustração dos nossos intercambistas, e me consola receber feedbacks como o da Aninha: “EU AMEI O MEU PROGRAMA, FOI O MELHOR ANO DA MINHA VIDA, NÃO ME ARREPENDO DE NADA E FARIA TUDO IGUAL E DE NOVO. OBRIGADO(A) POR TUDO.”
Por Perpétua (Pê) Devite
Diretora executiva da empresa FYI