CPI QUER SUSPENDER CONTRATOS COM A FIB BANK
A CPI da Pandemia vai requisitar à Procuradoria-Geral da República que determine, em caráter de urgência, a realização de investigação rigorosa de todos os contratos em que a FIB Bank figure como instituição garantidora. Além disso, a comissão vai encaminhar todas as informações ao Tribunal de Contas da União (TCU), para que seja feita uma auditoria em todos os negócios firmados.
A decisão foi aprovada nesta terça-feira (14) durante o depoimento do advogado e empresário Marcos Tolentino da Silva, dono da Rede Brasil de Televisão, suspeito de ser um sócio oculto da empresa FIB Bank — que, apesar do nome, não é um banco —, responsável por fornecer à Precisa Medicamentos garantia no fechamento do contrato da vacina indiana Covaxin com o Ministério da Saúde.
Depois de constatarem que a FIB Bank ofereceu garantias em outros negócios celebrados por órgãos públicos, os senadores também aprovaram requerimento pedindo informações ao Ministério da Economia, à Casa Civil, à Advocacia-Geral da União (AGU) e outros ministérios a respeito de cartas de fiança emitidas pela instituição.
Os parlamentares demonstraram espanto ao verificarem que a FIB Bank avalizou outros contratos no âmbito de órgãos da União e questionaram como os negócios foram concretizados.
— Aí está o pulo do gato. A Fazenda Nacional não era ouvida, a Procuradoria-Geral da República não era ouvida, a Advocacia-Geral da União [AGU], quando era ouvida, era ouvida tardiamente ou não era obedecida. Foi assim que aconteceu com a Covaxin. O advogado da AGU disse que faltava garantia, que a garantia tinha de ser bancária; eles não só descumpriram a lei, não só descumpriram o contrato, como aceitaram uma garantia que não é bancária de um banco que não é banco. Comprova o conluio — avaliou a senadora Simone Tebet (MDB-MS).
Direito ao silêncio
Assim como outras testemunhas, Tolentino chegou à comissão de inquérito protegido por um habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que lhe deu o direito de permanecer em silêncio em caso de perguntas que pudessem incriminá-lo.
Na sua fala inicial, o empresário deu breves esclarecimentos sobre suas participações na FIB Bank e em outras empresas. Ele informou que não possui qualquer participação no quadro societário da instituição garantidora.
As explicações não foram suficientes para esclarecer as dúvidas dos senadores. Diante da dificuldade de entendimento da estrutura societária e até mesmo da existência formal da empresa FIB Bank, o relator Renan Calheiros (MDB-AL) e outros parlamentares começaram a pressionar por detalhes na tentativa de entender melhor a situação. Neste momento, Tolentino passou a evocar o direito de permanecer em silêncio.
O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) insistiu, alegando que, na realidade, a empresa MB Guassu é a maior acionista do FIB Bank, com pouco mais de R$ 7 bilhões de capital; e a Pico do Juazeiro, a sócia minoritária, com R$ 300 milhões.
— Isso está, na verdade, desde a procuração, é público pela Junta [comercial]. Então, gostaria de permanecer pelo meu direito constitucional em silêncio porque seria uma explicação de muitas e muitas horas e eu gostaria de não me manifestar — repetiu a testemunha.
Sócio oculto
O relator Renan Calheiros (MDB-AL) afirmou que a comissão parlamentar de inquérito tem provas de que Marcos Tolentino é dono, representante ou administrador das empresas FIB Bank, Pico do Juazeiro e MB Guassu, inclusive conta com procurações de plenos poderes, em caráter irretratável, sem a obrigatoriedade de prestação de contas, o que caracterizaria a propriedade de Tolentino sobre as companhias.
A senadora Simone Tebet observou a sequência de irregularidades, esclarecendo que não existe, no direito brasileiro, uma procuração com poderes irreversíveis para vender e comprar e sem dar prestação de contas.
— Há cartórios no Brasil que não aceitam esse tipo de procuração, porque isso caracteriza e crava, de acordo com a jurisprudência, que a pessoa passa a ser proprietária. A partir do momento em que a Pico do Juazeiro entregou para ele uma procuração com poderes absolutos, irreversíveis, sem precisar prestação de contas, ele está dizendo o seguinte: ‘Toma, que o filho é seu’. A Pico [do Juazeiro] simplesmente, que é sócia do FIB Bank, deu para Tolentino a propriedade, a sociedade do FIB Bank — constatou Tebet.
‘Emaranhado’ de empresas
O relator também cobrou explicações sobre repasses de R$ 1,9 milhão da FIB Bank para a Brasil Space Air Log, empresa da qual Tolentino admitiu ser sócio, e outras transferências entre empresas que também seriam comandadas pelo empresário. Renan afirmou ainda que Rede Brasil de Televisão, a Pico Juazeiro, a Brasil Space Log e a Benetti registram contas na mesma agência em São Paulo.
Marcos Tolentino ficou em silêncio sobre todas essa questões, mas Renan Calheiros afirmou que a CPI já tem informações que comprovam que esse “emaranhado” é controlado pelo empresário.
— As movimentações financeiras realizadas entre a Brasil Space Air Log e a Pico do Juazeiro e o FIB Bank demonstram em sinal de que Tolentino ainda comanda essas empresas, pelo emaranhado, pelas procurações e pelas movimentações financeiras, que são incontestáveis do ponto de vista da investigação — avaliou o senador.
Família e negócios
O advogado seguiu sendo pressionado ao longo da tarde e repetindo o direito ao silêncio. Após fazer um levantamento, a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) constatou que Tolentino é dono de 15 empresas, sendo 11 ativas e quatro inativas. Segundo a parlamentar, há outras dezenas de empresas em nome de familiares do empresário.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) por sua vez, pesquisou junto à Receita Federal e descobriu que Tolentino tem quatro CPFs cancelados e dois ativos. O parlamentar estranhou a situação e quis saber o que estava ocorrendo, sem, no entanto, obter resposta.
— Senador, eu só tenho um único CPF meu, regular. Esses outros eu desconheço. Então, eu vou permanecer em silêncio até que se veja isso aí, porque sinceramente desconheço — resumiu.
Tentativa de fraude
O senador governista Marcos Rogério (DEM-RO) lembrou que não foi o governo federal que contratou a FIB Bank pra garantir o contrato de compra de vacina, foi a Precisa Medicamentos, que, por sua vez, já negociou com outros governos.
— Na pior das hipóteses aqui, seria o Ministério da Saúde vítima e não autor, não protagonista de um crime. Mas os mesmos que estão aqui a fazer acusações talvez tenham faltado ao dever de casa de olhar pelo retrovisor do tempo para saber que essa Precisa e essa FIB Bank já fizeram negócios com o governo sim. Em 2018, compra de preservativos: lá estava a Precisa e lá estava o FIB Bank – vai vendo, Brasil! — afirmou.
Ainda conforme o parlamentar, a CPI pode estar diante de uma tentativa de fraude contra a administração pública, uma espécie de estelionato de maneira indireta, pois o contrato principal é o da empresa contratante.
— Quem está contratando com o ministério é quem está vendendo, é quem está oferecendo, é quem disse que vai entregar coisa certa por preço certo e em prazo determinado. Essa FIB Bank aparece numa situação de adesão a um contrato para oferecer garantia. É um contrato vinculado. Nesse caso da compra das vacinas, sequer podemos falar em crime, porque não houve a concretização do negócio jurídico. Seria o caso da tentativa? Poderia se apurar nesse momento a tentativa de se induzir a erro a administração ou de considerar válido um seguro sem lastro? — indagou.
Reta final
Penúltimo senador a se manifestar, Alessandro Vieira (Cidadania-SE) disse saber que o relator tem objetivos claros de encerrar a CPI em setembro, mas fez dois alertas: a dificuldade de acesso a documentos e a necessidade de a comissão ouvir uma série de outras pessoas.
— A CPI não pode se omitir. O nosso prazo real vai até início de novembro. Acho justo e concordo com antecipações, mas não antecipações que acabem cerceando o trabalho todos — finalizou.
Fonte: Agência Senado
Imagem: Leopoldo Silva/Agência Senado