a
© 1999-2022 Agência Difusão.
HomeFilosofiaRENÉ DESCARTES

RENÉ DESCARTES

René Descartes

RENÉ DESCARTES

René Descartes foi um importante filósofo e matemático, além de ter deixado significativas contribuições para a Física. Seu método filosófico introduziu um pensamento mais exato no campo da Filosofia — o que o fez ser considerado o primeiro filósofo da vertente racionalista e colocou-o em posição de destaque para a constituição do pensamento moderno.

Graças ao rigor dos estudos matemáticos de Descartes e à criação de seu plano de coordenadas, é possível hoje estabelecer os estudos da geometria analítica e da geometria espacial com maior precisão.

Biografia

René Descartes nasceu em Haye, província francesa, em 1596. Ficando órfão de mãe quase um ano após o seu nascimento, cresceu sob os cuidados do pai e de uma ama. Seu pai era funcionário público de Haye e providenciou uma educação de elite para o filho, que, desde cedo, teve contato com a Filosofia, com a Astronomia e com a Matemática.

Descartes estudou no colégio Royal Henry Le Grand, seminário dirigido por jesuítas no Castelo de La Flèche. Aos 19 anos terminou o seminário, e algumas inquietações sobre a Filosofia ensinada pelos jesuítas, de tradição escolástica e essencialmente aristotélica, deixaram-no pensativo.

Quando terminou o curso básico, ingressou no curso de Direito na Universidade de Poitiers. Aos 22 anos de idade, tornou-se bacharel em Direito, mas nunca exerceu a advocacia ou se envolveu com a carreira jurídica.

Ao formar-se, Descartes envolve-se com a carreira militar, tendo passado mais de um ano como soldado alistado no exército do príncipe holandês Maurício de Nassau. A carreira como soldado é curta, pois o filósofo descobriu não ter nascido para o militarismo.

Não obstante, suas contribuições como conselheiro e estrategista militar fizeram-se presentes em quase toda a sua vida, tendo sido encerradas apenas quando o francês completou 49 anos. Essa atividade era, no entanto, secundária em sua vida dedicada à Filosofia e à Matemática.

O ingresso no exército quando jovem revelou a Descartes uma busca pessoal pela aventura, ao que ele seguiu com inúmeras viagens que fez pela Europa. Apesar do espírito aventureiro, contam os seus biógrafos que, desde criança, o pensador era muito reservado e evitava o convívio social, preferindo ficar sozinho e cair em seus profundos pensamentos, o que fez com que deixasse poucos vestígios de sua vida pessoal.

Também com 22 anos começou a estudar Matemática e viu-se fascinado pela exatidão daquela ciência, algo que já despertara a sua curiosidade desde os anos vividos em La Flèche. Aos 33 anos, Descartes havia escrito um livro intitulado Tratado sobre o mundo.

O filósofo optou por não publicar o manuscrito sobre ciência natural, que defendia uma tese heliocêntrica, em decorrência do processo e condenação vividos por Galileu Galilei.

Em 1637, Descartes publica Discurso do método, sua mais importante obra filosófica, e, em 1641, publica Meditações metafísicas, outra grande obra de sua autoria. Em 1649, o pensador francês aceita o convite da rainha Cristina, da Suécia, apesar de hesitar bastante. Cristina era uma admiradora da filosofia cartesiana, e o filósofo parte para ser seu conselheiro.

O rigoroso inverno sueco causa uma forte pneumonia em Descartes, que morre em 1650. Em 1663, a Igreja Católica proíbe alguns de seus livros, em especial Meditações metafísicas, por adentrar em assuntos teológicos.

Descartes e a Filosofia

Descartes revolucionou o pensamento filosófico moderno. Suas contribuições deram origem à tradição racionalista que se baseia no entendimento de que o conhecimento racional é inato ao ser humano. Assim como Platão, o filósofo francês concebeu o ser humano como um ser composto por uma dualidade psico-física, isto é, por uma mente ou alma (psique) e por um corpo.

Esses elementos são designados por Descartes como res cogitans (coisa pensante) e res extensa (coisa extensa). Nessa concepção, a alma ou mente (coisa pensante) é o atributo maior do ser humano e o seu corpo (coisa extensa) é a extensão da alma. O corpo depende da alma para viver do mesmo modo que a alma depende do corpo para habitar o mundo.

Descartes observou que os seus professores de Matemática tinham um método preciso e exato para chegarem a conclusões de raciocínios, o que os garantia certeza e não gerava controvérsias, ao passo que os seus professores de Filosofia envolviam-se em querelas por utilizarem métodos próprios e diferentes.

Para Descartes, não era possível firmar uma Filosofia sólida num terreno movediço, fazendo-se necessário estabelecer um método preciso para a Filosofia.

Principais ideias
A razão é inata ao ser humano, ou seja, nós já nascemos com as ideias racionais embutidas em nosso intelecto. O que diferencia a inteligência de uns e de outros é a maneira como utilizamos a nossa inteligência.

O conhecimento deve ser claro e distinto. Tudo aquilo que gera dúvida deve ser afastado do âmbito do conhecimento verdadeiro.

O conhecimento filosófico deve ser consolidado por um método que garanta a confiabilidade do que se conhece.

Racionalismo
As palavras iniciais de Descartes em Discurso do método apontam as primeiras pistas para o entendimento do seu racionalismo. Assim o filósofo escreveu:

O bom senso é a coisa do mundo melhor partilhada, pois cada um pensa estar tão bem provido dele, que mesmo os mais difíceis de contentar em qualquer outra coisa não costumam desejar tê-lo mais do que o têm.

Não é verossímil que todos se enganem nesse ponto: antes, isso mostra que a capacidade de bem julgar, e distinguir o verdadeiro do falso, que é propriamente o que se chama o bom senso ou a razão, é naturalmente igual em todos os homens; e, assim, que a diversidade de nossas opiniões não se deve a uns serem mais racionais que os outros, mas apenas que conduzimos nossos pensamentos por vias diversas e não consideramos as mesmas coisas.i

O racionalismo, além de estar assentado nas ideias inatas, toma por base a ideia de que o conhecimento fornecido por outras fontes que não a razão pode ser enganoso. Isso implica que somente o conhecimento racional, fruto das deduções, é claro e distinto. Somente o processo dedutivo (utilizado por excelência na Matemática) pode ser adotado como meio seguro e único para evidenciar aquilo que é conhecido.

Quando Descartes fala de “não considerarmos as mesmas coisas” quando falamos do bom senso e da razão, ele quer dizer que deve haver um método preciso para atingir-se a razão e que esse método não pode ser o empírico.

Aliás, a grande fonte de sua decepção com a filosofia escolástica, que o fez romper com a tradição aristotélica, foi o assentamento do conhecimento em diversas fontes, entre elas a experiência.

Para fundamentar sua teoria, o filósofo elabora um método baseado, primeiramente, na dúvida metódica e hiperbólica. Metódica porque era organizada por um método, e hiperbólica porque era exagerada.

O método cartesiano faz surgir na Modernidade um novo tipo de ceticismo: diferente do ceticismo helênico, os ideais cartesianos pretendiam negar um tipo de juízo do conhecimento para chegar-se a um julgamento final e verdadeiro.

Para isso, era necessário negar as “certezas” advindas da experiência e de tudo aquilo que não fosse estruturalmente correto.

As regras para o método são as seguintes:

Evidência: Jamais aceitar como verdadeiro algo duvidoso, ou apenas aceitar as formas de conhecimento claras e distintas.

Análise: Ao enfrentar um problema filosófico, dividi-lo em partes, quantas forem possíveis, para facilitar a sua compreensão.

Síntese: Sempre começar resolvendo os problemas menores, as partes menos complexas, partindo então rumo aos problemas maiores, pois a junção das múltiplas partes pode resolver ou fornecer pistas para a resolução do problema como um todo.

Enumeração: Enumerar todas as partes fracionadas e revisar cada etapa assim que finalizada, pois isso facilita a identificação de erros.

O método cartesiano para a Filosofia fornece elementos para o desenvolvimento de posteriores métodos científicos mais avançados.

Cogito
O método cartesiano e a sua dúvida metódica e hiperbólica fizeram-no chegar ao cogito, o primeiro conhecimento estritamente verdadeiro, obtido por meio da dedução. Estes foram os passos percorridos pelo filósofo para que chegasse ao cogito:

Eu devo duvidar de tudo para atingir um conhecimento rigoroso.

Ao duvidar de tudo, duvido inclusive de mim mesmo, de minha essência e de minha existência.

Ao duvidar, eu estou pensando.

Se penso, logo eu existo.

O cogito cartesiano foi traduzido para o Português como “penso, logo existo”. No entanto, a frase escrita originalmente, em francês, “je pense, donc je suis”, pode indicar ambiguamente essência e estado.

Uma tradução fidedigna seria “penso, logo sou”. Acontece que a segunda meditação, das Meditações metafísicas, equipara essência e existência, o que nos permite traduzir o cogito de modo que nos proporcione uma maior compreensão de seu sentido.

Obras de Descartes
Listamos a seguir as principais obras do filósofo René Descartes:

Discurso do método: Texto curto e escrito em Francês (era comum que os intelectuais da época escrevessem em Latim, o que restringia o escrito a um público douto), pois a intenção de Descartes era que o seu livro atingisse a todos que compartilhassem da racionalidade.

Essa obra apresenta o método cartesiano, as suas justificativas e a sua contribuição para o racionalismo.

Meditações metafísicas: Nessa obra o filósofo discute as questões metafísicas tradicionais, como a questão da alma e de Deus. Descartes era cristão, mas modifica as estruturas cristãs ao tratar da alma e do alcance do logos proporcionado por Deus.

Princípios de Filosofia: Essa obra é uma espécie de manual para o fornecimento de conhecimento filosófico na educação jesuíta. Descontente com a sua formação de teor escolástico, o filósofo escreve tais princípios pensando em poder disseminar o racionalismo já na educação de base, a fim de formar estudantes de acordo com as sólidas ideias racionais claras e distintas, de uma filosofia racionalista.

Frases
“Penso, logo existo.”

“O bom senso é a coisa do mundo melhor partilhada.”

“Muitas vezes as coisas que me pareceram verdadeiras, quando comecei a concebê-las, tornaram-se falsas, quando quis colocá-las sobre o papel.”

“Não basta termos um bom espírito, o mais importante é aplicá-lo bem.”

DESCARTES, René. Discurso do Método. Trad. Paulo Neves e introdução de Denis Lerrer Rosenfield. Porto Alegre: L&PM Editores, 2010, p. 37.

Por Francisco Porfírio
Professor de Filosofia

Share With:
Rate This Article

redacao@agenciadifusao.com.br